Um tema recorrente que sempre acabo sendo questionado é sobre a necessidade contemporânea de uma área de inteligência competitiva nas organizações.
Durante esta semana, excepcionalmente, foram três questionamentos em dois dias de conhecidos meus de círculos sociais totalmente distintos (empresa, ex-colega da USP e membro do grupo cineclubista) sobre a importância e a necessidade da IC. Bem, vou tentar sistematizar brevemente, e tenho a plena consciência de que a simplificação poderá resultar em crassos equívocos.
Acredito que a necessidade de uma área específica e exclusiva de IC se faz necessário para a centralização e processamento de diferentes informações, provindas de diversas fontes, dos mais variados assuntos possíveis, com densidades completamente díspares. A área de IC cria, digamos, um Mínimo Múltiplo Comum, o famoso MMC, para a distribuição/divulgação nas organizações. É, de certa forma, vital, pois cada área tem seu modvs operandi. Claro, depende muito do perfil da IC, que se diferencia de uma área de gestão da informação, por exemplo, pois ao tencionar informações distintas, e buscar uma sintonia, um padrão, adquire uma visão panorâmica, holística, onde o todo é maior que a simples soma/decomposição das partes. E claro, não se faz IC isoladamente – é de extrema importância que qualquer colaborador que alimente bancos de dados entenda a finalidade de sua aparente e simples ação. Já trabalhei em projetos em que se “perdem” dias e dias apenas na estruturação e limpeza dos dados.
IC no passado – a Informação com I maiúsculo, esteve hegemonicamente durante muito tempo ligada ao Estado Maior (Forças Armadas e Segurança Nacional) – ainda está de uma certa maneira – conhecimento do território, das armas, do monitoramento das atividades inimigas, etc. Com o triunfo da Pax Americana e a expansão do processo de globalização capitalista (após a derrocada do bloco soviético), o risco de uma guerra de proporção mundial entre as nações desenvolvidas se viu reduzido à praticamente zero. Não que não houvesse antes do capitalismo disputas comerciais, pelo contrário, elas ocorrem desde praticamente o início da sedentarização do homem, evidentemente que em proporções e escalas totalmente diversas das quais se quer podemos vislumbrar atualmente. Por exemplo, o célebre ensinamento de Sun Tzu (aproximadamente VI a.C.): “Se conhecemos o inimigo e a nós mesmos, não precisamos temer o resultado de uma centena de combates. Se nos conhecemos, mas não o inimigo, para cada vitória sofremos uma derrota. Se não nos conhecemos e nem ao inimigo, sucumbiremos em todas as batalhas”. Por analogia, estamos sob o julgo interminável de incessantes batalhas, porém, em outra esfera, no mercado. Basicamente as técnicas de IC almejam captar a essência do ensinamento de Sun Tzu. A função social da guerra foi internalizada por nossa sociedade.
No livro “Fundamento de Inteligência Competitiva”, dos autores Andréa Mendes, Elaine Marcial e Fernando Fernandes, apresentam um exemplo da Idade Média (séculos XV/XVI), referente à atividades muito semelhantes ao que consideramos IC atualmente. O House of Fugger Bank, pertencentes à uma poderosa e influente família germânica, coletava e difundia informações para seus executivos espalhados em diversas representações. O teor destas informações orbitava em torno do monitoramento de atividades locais, seus resultados, tendências econômicas e políticas, observadas e coletadas através de correspondentes.
Atualmente temos este processo vulgarmente amplificado, numa escala sem precedentes na história humana. Entretanto, paradoxalmente, acabamos produzindo o efeito diametralmente inverso, nos encontramos perdidos no e pelo excesso de informação.
T.S.Eliot, em 1934, no poema “The Rock”, já nos alertou:
[…]
The endless cycle of idea and action,
Endless invention, endless experiment,
Brings knowledge of motion, but not of stillness;
Knowledge of speech, but not of silence;
Knowledge of words, and ignorance of the World.
All our knowledge brings us nearer to our ignorance
[…]
Where is the life we have lost in living?
Where is the wisdom we have lost in knowledge?
Where is the knowledge we have lost in information?
Ter a consciência deste paradoxo é um fato, para mim, profundamente assustador. A divisão social do trabalho, elevou como nunca a nossa capacidade produtiva, numa ínfima fatia de espaço/tempo, se comparada à História da Civilização. Para mim a necessidade de uma área de IC está inserido num processo mais amplo do movimento do mercado, dentro de uma mesma empresa (ou constelação/agrupamento social) ocorre o risco da perpetuação do som do silêncio (The sound of Silence – Simon and Gerfunkel).
A verdadeira IC, em meu singelo entendimento, não está na competição, por mais contraditório que isso possa parecer. Pois, de que adianta perpetuarmos uma estratégia se não perpetuarmos nossa existência, num sentido íntimo e profundo. Não devemos nos deixar guiar livremente pelo fluxo perpétuo das estações, sejam elas climáticas ou econômicas.
Quem teve paciência e chegou até aqui, deve estar se perguntando, e onde está a IC nisso tudo? Talvez em tudo, talvez em nada! Não acredito que este cara escreveu todas estas bobagens. Enfim, se isso fez algum sentido, se isto o instigou de uma certa forma, valeu a pena.Dever cumprido! Continuarei escrevendo. Gosto de tensionar ao máximo do absurdo e de meu repertório, um assunto aparentemente batido e burocrático. Somos seres complexos, movidos por paixões, desejos (O elogio da loucura – Erasmo de Roterdã). Lembro de uma aluna (acho que do 1° colegial), num estágio da licenciatura de geografia (escola pública), dizer para o professor: ‘Não temos a dimensão da falta que a Arte nos faz’. Não me recordo exatamente qual era contexto, mas isso me marcou profundamente. O que chamamos de inteligência, e adjetivamos com competitiva, é parte integrante e integral de um corpo que ri, chora, treme, raciocina, teme, sonha, deseja… Acredito firmemente que qualquer progresso psíquico-social passará por nossa re-humanização e autonomia. Podemos falar infinita e repetidamente de técnicas de inteligência competitiva, mas de que adiantaria se forem apenas para serem replicadas e aplicadas de forma vulgar sem um posicionamento crítico e analítico? Estariam fadadas a mais do mesmo! É complexo, porém ao mesmo tempo, simples.
Douglas Vidal
Bom texto, gostei!
Luis Paulo Farias
Obrigado Douglas!
Priscila Stuani
MMC? Gnete… Quantos anos que não via isso! RS! Legal essa comparação, a cada post a área de IC para mim é como um universo novo a ser desvendado. Muito interessante esse tato com a informação, cuidado e manejo.
Boa reflexão!
Luis Paulo
Hahaha Pri! Pois é tem alguns conceitos que ficam ecoando em cabeça almejando companhia. Tenho que fazer um esforça para ligá-los à outros. Espero contribuir muito com as reflexões, e que elas de alguma forma sirvam para instigar e tensionar. E obrigado pela paciência comigo Pri…